quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Carmen Maria Pucci

Um dia qualquer, numa esquina qualquer.

Era uma sexta-feira de um dia de primavera, ensolarado, meio dia mais ou menos.
Eu andava pela calçada rumo à UFRGS, conversando com meus botões e cumprimentando todas as pessoas que passavam por mim, algumas me olhavam com interrogação como a dizer “te conheço?”, mas respondiam e saiam com um sorriso nos lábios, como a pensar, “ta louca a coitadinha”, e eu? eu contabilizei mais um sorriso do dia. Quando faço isso, passo o dia feliz pois recebo resposta sempre, semmmmpre, e um sorriso de volta (seja de quem acha que me conhece mas não lembra, seja da criança, dos adolescentes, do gari, do flanela), mas um em especial me deixou emocionada. Quando saudei uma senhora idosa, que estava na frente de sua casa a espera de alguém, ela me respondeu em alto e bom som “QUE MARAVILHA, VOCÊ FEZ MEU DIA PASSAR DE CINZA PARA AMARELO, COM UM GRANDE SOL A ILUMINAR MEUS CABELOS BRANCOS”, foi lindo e eu saí com lágrimas nos olhos.

Mas voltando à sexta feira. De longe senti que havia algo diferente na esquina da Oswaldo com a não sei o nome da que vai para o túnel. Não era panfletagem comum para compra de AP, conserto de mil coisas, contribuição para todas entidades assistenciais e as faz de conta que são, nem gente esmolando ou importunando os motoristas e transeuntes, mas era sim uma turma em que todos vestiam camisetas brancas, alegres, coloridos, formada de alunos, professores e simpatizantes de uma causa que tem tudo a ver com nosso tempo e que algumas vezes não nos damos conta que um simples gesto, uma simples palavra, um simples olhar muda muito e pode mudar tudo para alguém.

GENTILEZA GERA GENTILEZA

Quando vi, fiquei maravilhada, com uma vontade muito grande de participar, de tornar maior uma semente que a Adriana semeou em todos os e-mails que me mandou, da sua delicadeza e gentileza sempre, sempre, em qualquer lugar. Disposta a ajudar e contribuir para que todos sintam-se bem, preocupada em consolar uma colega emocionada, dando o seu abraço terno de mãe de todos, e ela estava lá, na esquina, junto com o Rodrigo e o pessoal do IA, com uma faixa enorme, amarela escrita com letras vermelhas aquelas palavras mágicas “GENTILEZA GERA GENTILEZA”. Estendiam na frente dos carros cada vez que o semáforo (sinaleira para nós) ficava vermelho. Tinha muita gente entregando as pessoas que passavam nas calçadas e aos motoristas, pequenas tiras com as mesmas palavras.

No início fiquei parada somente olhando, observando a reação das pessoas e mais uma vez tive certeza que podemos mudar esse ranço que está impregnando as pessoas, que na correria do dia a dia, enfrentam um trânsito caótico, problemas no trabalho ou falta dele, tempo escasso para a família, etc e ainda uma imprensa pessimista que só noticia tragédia, crime, fraude, violência gratuita e é conivente de um processo de massificação concreta do ser humano, quando é a favor de obras perniciosas à vida da população, que destroem a natureza e encaixotam o homem, em busca do lucro fácil.

E ali, parada, percebi que pequenas ações, geram reações. Num primeiro momento talvez as pessoas até coloquem fora a tímida tirinha da gentileza, mas tenho certeza que quando escutar ou ver a palavra escrita em qualquer lugar, lembrará desse dia em que uma pessoa lhe entregou uma gentileza com um sorriso.

É claro que houve alguém, e sei que foram muito poucos, talvez não complete os dedos de uma mão, que se recusaram a receber, mas um especialmente, eu vou descrever. A Adriana chegou com toda educação, com um sorriso e estendendo a mão para entregar ao motorista a tirinha e lhe disse (como todos estavam dizendo) “uma gentileza para você”, não pude acreditar que uma pessoa jovem como aquele rapaz fizesse tamanha grosseria. Primeiro balançou várias vezes a cabeça e fechou a janela de forma rápida e com cara de poucos amigos. Fiquei pensando: talvez já tenha sido assaltado “o pobre”, mas ali não estavam assaltantes pois o seu carro esta muito atrás de todos que já tinham recebido a tirinha, alguns que quase jogavam o corpo para fora da janela para ganhar a sua também, e ninguém buzinava de um carro que ficava parado mais um pouquinho para receber a sua. Buzinavam alguns mas para felicitar.

Os transeuntes também ganhavam e alguns se ofereciam para ajudar. Quase todos paravam para ver do que se tratava e saiam felizes com seus sorrisos soltos ao sol e vento fazendo com que essa alegria contagiasse a todos que encontravam pelo caminho.

Também não posso deixar de falar de Três garotas do Colégio militar, uniformizadas com suas boinas vermelhas, meia americana e sapatos pretos. Pararam na esquina e ficaram a contemplar a cena, e nos seus rostos estava estampada a mais genuína expressão de curiosidade misturada com um pouco de perplexidade, foi um momento que poderia fotografar e ganhar um prêmio, pois as meninas tinham a mesma expressão, a mesma postura corporal de quem precisa ir, mas que quer ficar mais um pouco para descobrir o que está havendo.

Chamei a atenção de algumas pessoas que estavam por perto e como todo bom artista também visualizaram um belo quadro. Pena que ninguém conseguiu fotografar.

Em algum momento, o Rodrigo me atirou uma camiseta, para participar, e parece que a simples mudança de uma roupa, nos remete para a frente de batalha, em que nos sentimos uma Joana D’Arc e somo capazes de lutar por aquilo em que acreditamos.

Parabéns Adriana, e a todos que levaram gentileza a muitos.

Carmen Maria Pucci

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